Numa
conversa sobre educação, ouvi comentários de alguns colegas sobre
questões relativas à moral que me deixaram confuso sobre se realmente
conseguiam compreender o papel da moralidade na educação. Mesmo
alguns pesquisadores da educação costumam, aparentemente, confundir
a validade da preocupação moral na educação escolar com um antigo
componente curricular ensinado durante o último regime militar
brasileiro (a chamada “Educação Moral e Cívica”). Aqui,
gostaria de brevemente explicar porque acredito que o que fazemos na
escola pode ser identificado como educação moral.
Sei
o quanto a maioria dos professores provavelmente
odiaria me ouvir dizendo isso, mas o direi assim mesmo: o
ensino dos componentes curriculares da área das
chamadas “ciências
humanas” está,
inevitavelmente, entrelaçado a uma educação moral dos
alunos. E não digo isso apenas para fazer um trocadilho com o
nome da antiga matéria que se ensinava nas escolas brasileiras
durante o último regime militar!
Se
você ainda não desistiu de continuar a ler este texto, permita-me
apresentar minha defesa.
Na escola, sempre que abordamos algum tema
que lide com problemas que enfrentamos socialmente, no passado ou no
presente – e a abordagem de tais tipos de temas ocorre com
frequência na área das humanidades –, tomamos posições no que concerne
a tais problemas (voluntária ou involuntariamente, favorável ou
infavoravelmente, etc). Assim, se tratamos acerca de temas como
escravidão, guerras, racismo, sexismo, liberdade de pensamento,
discriminação religiosa, colonialismo, violência, trabalho
infantil, migração etc, explícita ou implicitamente expomos nossa
compreensão da natureza moral de tais questões. Se, em aula, por
exemplo, condenamos o racismo, a violência e a exploração, seja
por acreditarmos que sejam imorais, ou simplesmente porque somos
obrigados pela legislação ou pelo senso de correção política,
não importa – o que importa, aqui, é que essa condenação faz
parte duma educação moral do aluno.
Felizmente,
ainda não tive o desprazer de conhecer um professor ou professora
que ensinasse a seus alunos que um ser humano de pele negra seja,
cientificamente comprovado, inferior a um ser humano de pele branca,
ou que não há nada errado em sair por aí resolvendo seus problemas
por meio da força. Todos os professores e professoras que conheci
até hoje na Educação Básica têm, felizmente, ensinado, explícita
ou implicitamente, coerente ou incoerentemente, que há limites entre
o moral e o imoral nas relações humanas – na Educação Superior
isso se dá de forma distinta, onde já ouvi defesa de posições
que, obviamente, não se poderia defender diante de crianças ou
adolescentes. Todos esses professores e professoras, mesmo na
Educação Superior – novamente, explícita ou implicitamente,
coerente ou incoerentemente –, levam a cabo uma educação moral.
Quando,
por exemplo, um professor universitário, que seja crítico do que
chama de “moralismo religioso”, professa uma palestra acerca da
condição da mulher na “sociedade patriarcal machista”,
incitando reflexões e incentivando mudanças de comportamento, o que
ele está fazendo é educação moral. Comparando isso ao que seria
feito tradicionalmente por um religioso, por exemplo, suas premissas,
suas razões, os detalhes de suas argumentações, e mesmo suas
conclusões podem ser distintas, mas ambos estariam engajados num
tipo de educação moral. O mesmo ocorre na escola. Você não
precisa ser religioso, acreditar numa deidade, ou corresponder a
todas as expectativas tradicionais de moralidade ou eticidade para se
engajar no processo de ensino-aprendizagem moral. Só precisa ser
humano!
Nenhum comentário:
Postar um comentário