domingo, 4 de janeiro de 2015

Educação moral?


Numa conversa sobre educação, ouvi comentários de alguns colegas sobre questões relativas à moral que me deixaram confuso sobre se realmente conseguiam compreender o papel da moralidade na educação. Mesmo alguns pesquisadores da educação costumam, aparentemente, confundir a validade da preocupação moral na educação escolar com um antigo componente curricular ensinado durante o último regime militar brasileiro (a chamada “Educação Moral e Cívica”). Aqui, gostaria de brevemente explicar porque acredito que o que fazemos na escola pode ser identificado como educação moral.

Sei o quanto a maioria dos professores provavelmente odiaria me ouvir dizendo isso, mas o direi assim mesmo: o ensino dos componentes curriculares da área das chamadas “ciências humanas” está, inevitavelmente, entrelaçado a uma educação moral dos alunos. E não digo isso apenas para fazer um trocadilho com o nome da antiga matéria que se ensinava nas escolas brasileiras durante o último regime militar!

Se você ainda não desistiu de continuar a ler este texto, permita-me apresentar minha defesa.

Na escola, sempre que abordamos algum tema que lide com problemas que enfrentamos socialmente, no passado ou no presente – e a abordagem de tais tipos de temas ocorre com frequência na área das humanidades –, tomamos posições no que concerne a tais problemas (voluntária ou involuntariamente, favorável ou infavoravelmente, etc). Assim, se tratamos acerca de temas como escravidão, guerras, racismo, sexismo, liberdade de pensamento, discriminação religiosa, colonialismo, violência, trabalho infantil, migração etc, explícita ou implicitamente expomos nossa compreensão da natureza moral de tais questões. Se, em aula, por exemplo, condenamos o racismo, a violência e a exploração, seja por acreditarmos que sejam imorais, ou simplesmente porque somos obrigados pela legislação ou pelo senso de correção política, não importa – o que importa, aqui, é que essa condenação faz parte duma educação moral do aluno.

Felizmente, ainda não tive o desprazer de conhecer um professor ou professora que ensinasse a seus alunos que um ser humano de pele negra seja, cientificamente comprovado, inferior a um ser humano de pele branca, ou que não há nada errado em sair por aí resolvendo seus problemas por meio da força. Todos os professores e professoras que conheci até hoje na Educação Básica têm, felizmente, ensinado, explícita ou implicitamente, coerente ou incoerentemente, que há limites entre o moral e o imoral nas relações humanas – na Educação Superior isso se dá de forma distinta, onde já ouvi defesa de posições que, obviamente, não se poderia defender diante de crianças ou adolescentes. Todos esses professores e professoras, mesmo na Educação Superior – novamente, explícita ou implicitamente, coerente ou incoerentemente –, levam a cabo uma educação moral.

Quando, por exemplo, um professor universitário, que seja crítico do que chama de “moralismo religioso”, professa uma palestra acerca da condição da mulher na “sociedade patriarcal machista”, incitando reflexões e incentivando mudanças de comportamento, o que ele está fazendo é educação moral. Comparando isso ao que seria feito tradicionalmente por um religioso, por exemplo, suas premissas, suas razões, os detalhes de suas argumentações, e mesmo suas conclusões podem ser distintas, mas ambos estariam engajados num tipo de educação moral. O mesmo ocorre na escola. Você não precisa ser religioso, acreditar numa deidade, ou corresponder a todas as expectativas tradicionais de moralidade ou eticidade para se engajar no processo de ensino-aprendizagem moral. Só precisa ser humano!

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