Há
pouco mais de uma semana, numa escola nova – e bem diferente do
privilegiado ambiente sociocultural ao qual estava acostumado em
minha escola prévia –, iniciei o ano letivo. Uma turma, em
especial, tornou-se o retrato dos novos desafios para minha vida como
professor naquela nova realidade. Nosso primeiro encontro foi
barulhento, mas bastante frutífero. Desenvolvemos uma discussão em
pequenos grupos sobre algumas frases provocadoras. Eram adolescentes,
alunas e alunos do primeiro ano do Ensino Médio, sendo jovens
barulhentos. Apesar de eu ter ouvido alguns comentários negativos
sobre a turma um dia antes de nosso primeiro encontro, tudo
funcionara como esperado.
Uma
semana depois, a cena era bem diferente. O barulho era perturbador,
apesar de minhas tentativas de “trazê-los” à aula. Pareciam
sequer se importar com o fato de haver um professor em sala. A
maioria dos alunos e alunas daquela turma parecia nunca ter aprendido
noções básicas de bons modos em casa ou na escola. Uma voz
ergueu-se do fundo da sala com um xingamento torpe, e, segura de que
não seria punida, acrescentou: “É mais fácil que você perca seu
emprego do que eu seja mandada pra casa!”. Não preciso dizer que
fui tomado duma irritação anormal para uma personalidade como a
minha.
No
momento em que aquilo aconteceu, um zilhão de pensamentos pareciam
correr por minha mente. Uma cadeia de possíveis ações e
consequências invadiram meu raciocínio, como que servindo de
justificativa e condenação para qualquer coisa que eu fizesse.
Finalmente, lembrei-me que ela não poderia estar com raiva de mim,
já que não me conhecia; e, apesar de suas palavras e ações terem
sido desrespeitosas, seu desrespeito não era contra minha pessoa em
si, mas, no máximo, contra o papel que desempenhava ali, impondo-lhe
um tipo de conhecimento que não via como necessário.
Não
pedi que deixassem a sala – ela e os outros barulhentos que não
apreciavam o “perder o tempo com aula de Filosofia”. Por mais
fraco que isso possa parecer a outros professores, para mim seria
como dizer àqueles jovens – especialmente à garota que me xingara
– que eu desistiria deles facilmente.
Fugindo
ao meu plano de aula, pedi-lhes, como desafio, que se imaginassem
mortos e escrevessem um epitáfio para seus túmulos, como se fora um
amigo ou parente próximo escrevendo sobre eles. Poucos o fizeram,
mas os que foram escritos e compartilhados levantaram uma discussão
interessante sobre a consciência de si. Apenas nos últimos minutos
de aula voltei ao que ocorrera e deixei claro que aquele fora um
comportamento inaceitável, já que fora um desrespeito não só a
mim quanto ao resto da turma.
Hoje,
um dia depois do incidente, a Coordenação Pedagógica – que fora
informada sobre o que ocorrera – levou-me de volta àquela sala e
repreendeu vigorosamente a turma pelo ocorrido. Eles foram forçados
a me pedir desculpas. Confesso que me senti extremamente
desconfortável com a cena, mas, ao mesmo tempo, compreendo porque
aquilo foi feito.
Apesar
de aquele incidente, em particular, estar no passado, ele se junta a
outros tantos que já tive com alunos ao longo dos anos. E a pergunta
que sempre me vem à tona é “como lidar com comportamentos
indisciplinados, com sentimentos de frustração ou com a
demonstração de raiva por parte dos estudantes?” Será que
deveríamos encará-los como uma afronta a nós, ou seria “sintoma”
de outra coisa?
Como
tudo em nossas relações interpessoais, não há uma resposta única
e válida para todas as circunstâncias. Ademais, nem sempre seremos
capazes de dar a resposta adequada à situação durante o incidente
– pelo menos, isso é verdade em minha experiência pessoal.
Pessoalmente, penso que o que me resta, o que espero ser capaz de
fazer, é dar uma resposta madura e emocionalmente inteligente aos
problemas das relações com outras pessoas. E isso é algo que nunca
deixo de aprender em minha vida como professor.
Gibson